Indicadores socioeconômicos e tecnologias estão entre os desafios da educação em 2022

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Já se passaram 22 meses desde que os primeiros casos de Covid-19 foram detectados no Brasil. De 3 de fevereiro de 2020, quando o Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso de coronavírus, para cá, adaptações e mudanças foram necessárias em todos os segmentos sociais e econômicos. Afinal, a sociedade mudou. Tudo mudou. Definitivamente não somos mais os mesmos. Mas, em um cenário de tantos caos, como o da pandemia, podemos extrair aprendizados.

Tratando especificamente da educação, uma das bases da sociedade, a lista de aprendizados é extensa. Talvez até porque tenha sido este o segmento onde aconteceram as maiores transformações e que por tão cedo não será possível mensurar o nível de impactos, positivo e negativos.

Como medida de combate à Covid-19, creches e escolas, do ensino infantil ao ensino médio, além de instituições de ensino superior, tiveram que fechar as portas e entrar, ‘de cabeça’ e no ‘susto’, no ensino virtual. O debate quanto ao momento ideal de retorno às aulas presenciais foi amplo, e por vezes acalorado, envolvendo gestores públicos, representantes sindicais, profissionais da educação, e claro, pais e alunos.

Apenas nos últimos meses de 2021, foi permitida a retomada das atividades, inicialmente de forma híbrida, ocorrendo em períodos e cidades diferentes, nas redes particulares, que retomaram primeiro, e na rede pública. Neste período, muitas escolas fecharam as salas e não conseguiram mais abrir as portas, e muitas outras estão se organizando para 2022, esperado por muitos como o ‘ano do novo normal’.

Com as escolas fechadas ou operando apenas no ensino remoto, muitos alunos deixaram a educação em segundo plano. Pesquisa do Unicef e do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), com base na Pnad Covid de novembro 2020, mostrou que mais de 5 milhões de alunos, de 6 a 17 anos, não frequentavam a escola ou não haviam realizado qualquer atividade escolar na semana anterior ao levantamento.

Segundo Lise Mary Arruda Dourado, doutora em Educação e Contemporaneidade pelo PPGEduC/UNEB e professora adjunta da Universidade do Estado da Bahia, depois de praticamente dois anos com aulas remotas, e em alguns casos sem aula nenhuma, são grandes os desafios da educação no Brasil.

“Existem vários contextos sociais no panorama da educação brasileira e muito a ser resgatado antes até do interesse dos estudantes pelo ensino. É preciso que o poder público garanta a efetiva inclusão digital de todos os estudantes, pois muitos continuam sem acesso aos dispositivos tecnológicos, como celular, computador e tablet, em situação de privação do direito à educação; bem como a formação continuada de professores para o trabalho em ambientes virtuais de aprendizagem”, defende.

A educadora reforça que nos últimos dois anos, escolas e universidades vivenciaram o Ensino Remoto Emergencial (ERE) e não a Educação a Distância (EAD), e que há uma grande diferença entre as duas modalidades. No Ensino Remoto Emergencial, professores, estudantes e pais tiveram de lidar com o ensino virtual sem uma prévia formação específica e recursos tecnológicos escassos; já na Educação a Distância, modalidade regulada por uma legislação específica que pode ser implantada na educação básica, educação de jovens e adultos, educação profissional técnica de nível médio e na educação superior, conforme Portal do MEC (2017, p. 1), professores e estudantes são preparados para utilizar meios e tecnologias de informação e comunicação.

Além de resgatar o interesse dos estudantes, outro tópico que requer atenção é a distância entre as classes sociais. A pandemia mexeu em indicadores socioeconômicos como renda, emprego, segurança alimentar e moradia, que por sua vez impactam diretamente os mais vulneráveis. O resultado fica claro ao analisar que a maioria dos estudantes que não frequentaram a escola em 2020 é preta, parda e indígena e vive nas regiões Norte e Nordeste.

O Censo Escolar da Educação Básica 2021, divulgado em 21 de dezembro pelo Ministério da Educação, aponta ainda uma queda no número de matrículas dos alunos jovens e adultos. Muitos jovens precisaram abandonar os estudos e buscar emprego para ajudar na renda familiar.

“As disparidades são reais e visíveis. E, sim, há o risco de se ampliar ainda mais a distância entre as classes sociais, se não houver políticas públicas de inclusão digital de estudantes e professores em todo o território nacional. É necessário que sejam disponibilizados dispositivos tecnológicos e wi-fi de alta conectividade para todos. Além disso, garantir segurança no retorno às aulas presenciais, inclusive com distribuição gratuita de EPI’s para docentes e discentes; formação continuada de professores, sobretudo da rede pública, para o ensino em todas as suas modalidades, seja presencial, remota ou híbrida; e políticas públicas culturais de incentivo e acesso às produções artísticas, de democratização das artes. É por meio das artes que se amplia o repertório sociocultural das famílias que acompanharão e, em parceria com os professores, mediarão os estudos dos seus fi lhos”, afirma.

Ensino híbrido não é mais coisa do futuro
Mas não foi só o desemprego e a renda que afastaram os estudantes das escolas. A dificuldade de acessar a internet, seja pela falta de equipamentos adequados ou pela ausência de conexão, também teve sua parcela de responsabilidade.

Segundo dados do Cetic.br (Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação), que monitora a adoção das tecnologias de informação e comunicação (TIC), cerca de 70 milhões de brasileiros tinham acesso precário à internet em 2019. Em um esforço para manter as crianças estudando, durante o período de aulas remotas, muitos pais faziam uma espécie de revezamento do aparelho celular com os filhos.

E o cenário mundial aponta para uma nova tendência na educação, onde a tecnologia e o virtual não sejam mais vistos como um elemento de suporte ‘emergencial’, mas parte natural do processo de aprendizagem.

“O mundo contemporâneo ainda sofre com a pandemia e não está livre de outras emergências. Mesmo que o distanciamento social tenha fim e não haja a necessidade de reconfigurar os hábitos de convívio em grupo, optar pelo ensino híbrido seria uma medida preventiva, inteligente. Além disso, a experiência, mesmo que forçada, com o universo tecnológico, descortinou vantagens quanto ao uso do tempo e do espaço, reinventou novos hábitos virtuais e ampliou possibilidades de ensino-aprendizagem por meio das plataformas digitais”.

“Mas cabe ressaltar que, além das tecnologias, é imprescindível investir na formação profissional continuada dos professores, para que estes se sintam preparados, mais confortáveis para trabalhar em ambientes virtuais de aprendizagem e lidar com as ferramentas tecnológicas”, destaca Lise.

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