Lei visa repactuar dívidas e proteger consumidores superendividados. Processo pode ser conduzido via Procon

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cresce superendividados no brasil

Mariana, 40 anos, viu sua vida virar de ponta cabeça desde o início da pandemia. Em trabalho home office por mais de um ano e mãe solo de uma adolescente em período escolar, as despesas domésticas quase triplicaram e recorrer ao cartão de crédito e ao cheque especial foi inevitável. Isso sem falar na facilidade das compras via e-commerce. O resultado: uma dívida de mais de R$ 10 mil que Mariana não tem ideia de como vai pagar.

Nossa personagem e sua história, são fictícias, mas ela representa cerca de 60 milhões de brasileiros que possuem alguma dívida a pagar. Uma realidade para milhões de pessoas há anos, mas que se viu agravada durante a pandemia pelo alto índice de desemprego e a escalada dos preços, sobretudo dos ítens básicos como alimentação, combustível e energia.

Metade dessas pessoas com dívidas já podem ser classificadas como superendividados, que é quando a soma desses valores é tida como algo impossível de ser pago ante a renda desse consumidor. Para estes 30 milhões de brasileiros foi aprovada no início de julho a Lei nº 14.181/2021 – Lei do Superendividamento, como forma de educação financeira preventiva e, no caso dos já endividados, estabelece a possibilidade de uma repactuação das dívidas, de modo que esse consumidor recupere seu crédito, além de injetar cerca de R$ 350 bilhões na economia brasileira.

Para a advogada Naydmüller Dias, Coordenadora Geral do Procon Municipal de Lauro de Freitas-BA, o superendividamento, infelizmente, é uma constante no país há décadas pois o brasileiro tem por hábito comprar mais do que pode pagar, seduzidos pelas ofertas tentadoras e quase irresistíveis que o mercado oferece.

“Compras desordenadas, sem planejamento, acarretam sérios danos na área financeira daqueles que, por muitas vezes, se veem obrigados a endividar-se, até como forma de subsistência. Então a lei surge como forma de ajudar esses consumidores a repactuar suas dívidas, apresentando planilhas de planejamento para sanar seus débitos com credores, agindo com prudência e responsabilidade, retomando ao final, seu crédito. A ideia é que, ao educarem-se financeiramente, as pessoas passem a usar o crédito com mais consciência, evitando endividarem-se novamente”, frisou.

A nova lei alterou o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Para aderir, o consumidor propõe uma reunião com todos os credores para repactuação de dívidas, que pode ser mediada pela Justiça ou pelo Procon, de modo a encontrar um senso comum, que atenda ao acordado com os credores sem comprometer mais do que 35% da renda do consumidor.

Podem ser negociadas dívidas de cartão de crédito, crédito consignado, empréstimo pessoal, contas de água, luz, entre outras. Porém os contratos com garantia real, como financiamentos imobiliários e crédito rural são excluídos das dívidas passíveis de repactuação, não estando computadas para o superendividamento.

Tanto nas negociações intermediadas pelo Procon, quanto pela Justiça, o próprio consumidor pode entrar com o processo, sem a necessidade de um advogado. Naydmüller Dias reforça que a opção da mediação e conciliação através do Procon tende a ser mais célere, ante o abarrotamento processual que vivemos no judiciário.

“Se o cidadão seguir os ditames que a lei impõe, e as empresas aplicarem o que a lei ordena, sairemos da expectativa e passaremos a realidade de um país de ex-superendividados. Vale lembrar que, ao aderir a lei, é importante que o consumidor tenha consciência que o plano de adimplência pode levar até 5 anos e que neste período toda nova dívida deve ser evitada”, concluiu.

Vilões
O crescimento de 27,8% no índice de inadimplência registrado em Salvador, em julho, gera preocupação. Segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), elaborada pela Fecomércio-BA, 68,2% das famílias estão endividadas, maior índice desde setembro de 2013.

São 635 mil famílias que não conseguem pagar suas dívidas até a data do vencimento e a inflação só tem complicado ainda mais a organização financeira. O pior é que a alta nos preços, na região metropolitana de Salvador, nos últimos 12 meses, é percebida principalmente em itens básicos, como alimentos e bebidas (11,43%), transportes (15,10%), energia elétrica (19,15%) e do botijão de gás (27,88%), este último com a maior alta.

Pesquisa realizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul aponta que cerca de 80% dos consumidores que estão endividados recebem em média três salários mínimos e comprometem cerca de 65% da renda com o pagamento de dívidas, sobrando assim muito pouco para as necessidades básicas da família. Em muitos casos, por se tratar de crédito consignado, a parcela já é debitada automaticamente do salário ou benefício previdenciário, deixando a pessoa de mãos atadas.

Mas de acordo com a pesquisa realizada pela Fecomércio-BA, o cartão de crédito é o principal vilão dos soteropolitanos. Cerca de 91,7% das famílias de Salvador estão com dívidas no cartão de crédito. Naydmüller Dias destaca que neste quesito o cartão de crédito é seguido pelo cheque especial e crédito consignado, nesta ordem, por apresentarem as maiores taxas de juros, e que é importante que os consumidores estejam atentos também às prática abusivas de agentes de crédito, a exemplo da contratação de crédito consignado sem que haja uma requisição por parte do consumidor.

“Sobre o crédito consignado, percebemos uma prática contumaz realizada por alguns bancos, principalmente durante a pandemia, que é a contratação tácita de determinados serviços, como liberação de empréstimos, sem que o consumidor requeira, prática essa abusiva que viola os preceitos do Código de Defesa do Consumidor, e que são objeto de sanção pelas autoridades competentes, tanto administrativamente como é nosso caso, quanto judicial”.

Denúncias sobre esta ou outras violações ao consumidor podem ser feitas diretamente ao Procon, pelo telefone (71) 3288-8919, pelos e-mails atendimentoprocon@laurodefreitas.ba.gov. br ou denunciaprocon@laurodefreitas. ba.gov.br, e até nas redes sociais @proconlaurodefreitas.

A sede do Procon Lauro de Freitas funciona na Rua Silvandir F. Chaves, 158, sala 6, Recreio Ipitanga, de segunda a sexta-feira, das 8h às 14 horas.

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