A obra de reversão da drenagem da Lagoa da Base foi novamente autorizada pela prefeitura de Lauro de Freitas no final de fevereiro. A proposta é drenar a água pluvial daquela região em
direção ao rio Sapato, foz do rio Joanes e praias de Buraquinho, Vilas do Atlântico e Ipitanga. As entidades representativas dos moradores do bairro não concordam com a obra porque, com a água pluvial, seria despejado no Sapato e em direção às praias, também o esgoto doméstico não tratado que corre na região da Lagoa da Base.
Para os moradores da Lagoa da Base e rua da Irmandade, a obra significa o fim dos alagamentos que afetam quase quatro mil famílias a cada chuva mais intensa, inclusive invadindo as casas. Especialistas associados às entidades de moradores de Vilas do Atlântico defendem que a drenagem da região deve ser feita em direção à bacia do rio Ipitanga, à qual a Lagoa da Base naturalmente pertence – e não revertida para o Sapato.
O reinício das obras foi decidido entre a prefeitura, a Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder), a Embasa e o governo do Estado por meio de um “Termo de Acordo e Compromisso” (TAC) intermediado pelo vice-governador João Leão e assinado dia 25 de fevereiro em reunião na Governadoria do Estado. Pelo TAC, a prefeitura de Lauro de Freitas
se comprometeu a emitir alvará para a obra no prazo de 48 horas.
A minuta do TAC previamente encaminhada à Associação de Moradores de Vilas do Atlântico (Amova) e à Sociedade de Amigos do Loteamento de Vilas do Atlântico (Salva) previa apenas a anuência de ambas e da Associação de Moradores da Lagoa da Base. Já o documento final foi assinado por esta última, pela “União de Moradores de Vila Mar” e pela “Associação de Moradores de Ipitanga” – que mesmo não existindo formalmente vem se movimentando desde o ano passado.
Cleici Portal, que assinou como anuente representando Ipitanga, Paulo César Santos, de Vila Mar e Magno Rocha, da Lagoa da Base, que reivindicaram uma solução para o impasse, deram-se por satisfeitos com o resultado da reunião, mas Amova e Salva recusaram-se a assinar o documento, prometendo levar o assunto adiante. A Amova pretende judicializar o tema.
MINISTÉRIO PÚBLICO
Para Verônica Tambon, coordenadora geral da Salva, uma decisão “dessa magnitude” precisa passar por uma assembleia de moradores antes de ser aprovada. “Vou mobilizar a minha comunidade para discutir isso”, disse.
Janaína Ribeiro, presidente da Amova, lembrou que a questão está entregue ao Ministério Público (MP), que abriu inquérito civil para apurar a legalidade da obra – e que o TAC proposto não passou pela aprovação da promotoria – “que deveria, no mínimo, ser parte desse acordo”. Segundo a Amova, oMP ainda não recebeu a documentação que havia sido requisitada quando foi recomendada a paralisação das obras, em outubro do ano passado – recomendação acatada pela prefeitura na época.
De acordo com o prefeito Márcio Paiva (PP), o TAC agora assinado atende as exigências do Ministério Público. Uma das considerações incluídas no TAC afirma que o projeto “foi antecedido de amplo estudo técnico” aprovado pela Conder, pela prefeitura, Ministério das Cidades e pelo agente financeiro, a Caixa.
Janaína Ribeiro discorda, já que os documentos e estudos ausentes no licenciamento inicial ainda não teriam sido apresentados às promotoras Maria Augusta Carvalho, de Lauro de Freitas e Cristina Seixas Graça, coordenadora do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente e
Urbanismo (Ceama).
As promotoras requisitaram a apresentação dos processos referentes aos licenciamentos e outorgas, “inclusive estudos ambientais” do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), uma autarquia estadual, da secretaria municipal de Meio Ambientee Recursos Hídricos e da própria Conder – Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia – responsável pela obra.
A prefeitura de Lauro de Freitas, além de renovar o alvará no prazo de 48 horas e desembargar a obra, obrigou-se a “apreciar a solicitação de renovação da licença ambiental” que vence este mês – exatamente o ponto do inquérito civil em curso no MP. “Vamos nos reunir com o Ministério Público para dar seguimento à judicialização” da questão, disse Janaína Ribeiro. O objetivo
é obter uma decisão judicial que venha a embargar a obra.
TOMADA DE TEMPO SECO
Na reunião, o prefeito Márcio Paiva defendeu a Conder, que “não omiti u nenhuma informação, disse que é uma obra de drenagem, mas que vão sim, dejetos contaminados” e lembrou que o alvará inicial para a obra exigia a solução de esgotamento sanitário da Lagoa da Base – embora a rede de esgoto não esti vesse prevista no projeto.
A presidente da Amova considerou“mambembe” a proposta incluída no TAC para o esgotamento sanitário da Lagoa da Base– e que não abrange a área da rua da Irmandade, também a drenar para o Sapato. A solução seria um “Sistema Provisório Tomada de Tempo Seco”, a construir com
recursos do governo do estado.
O sistema convencional de esgotamento sanitário prevê duas redes independentes – uma para o esgoto e outra para a água pluvial. A solução de “tempo seco” consiste na interceptação do esgoto na própria rede pluvial quando não chove em excesso, bombeando-se os dejetos para emissários ou estações de tratamento.
Na ocorrência de chuvas mais intensas, a ideia é que o grande volume de água dilua o esgoto que vai chegar aos rios e à praia. O problema desse sistema está no meio termo: pode chover o sufi ciente para fazer transbordar o coletor de tempo seco, mas em volume insufi ciente para diluir os dejetos de esgotamento doméstico.
No caso da Lagoa da Base, a proposta do TAC é construir uma estação elevatóriae conduzir esses efluentes para a tubulação da Embasa em Salvador, via Ipitanga. O TAC refere textualmente um “sistema de esgotamento sanitário existente em Ipitanga”.
Essa “Tomada de Tempo Seco” seria construída em até 90 dias depois da liberação de recursos pelo estado, mas não ficou estabelecido prazo para tanto. A prefeitura de Lauro de Freitas aceitou operar e manter “com recursos próprios” a estação elevatória e o sistema de tomada de tempo seco, apesar de o esgotamento sanitário ser uma responsabilidade do governo estadual.
Márcio Paiva assina o TAC comprometendose a liberar as obras: falta renovar a licença ambiental.
Tudo isso seria provisório. Pelo documento, a Embasa se compromete a “elaborar projeto definitivo de rede de esgotamento da comunidade da Lagoa da Base” até julho de 2016, mas o TAC também não estabelece prazo para a construção dessa rede, nem impõe penalidades pelo eventual descumprimento do acordo.
A Conder, por sua vez, comprometeu-se a “promover reunião com as comunidades envolvidas para apresentar o projeto elaborado pela Embasa”.
PRAZO FATAL
O vice-governador João Leão defendeu a execução da obra – lembrando que reside em Vilas do Atlântico, nas proximidades dorio Sapato – e argumentou que a paralisação do projeto implicaria na devolução ao governo federal dos R$ 3,5 milhões já gastos ali, além da perda dos R$ 23,8 milhões a ela destinados. O termo final do contrato de repasse de recursos para a obra vence em
junho próximo.
“A paralisação da obra com a consequente ausência da medição é causa impeditiva à renovação do referido ajuste, acarretando, de igual sorte, a devolução do recurso”, lista o TAC como uma das considerações prévias. A empresa contratada para executar a obra já teria manifestado interesse em rescindir o contrato alegando prejuízos causados pelo embargo.
“Precisamos acelerar este processo, senão vamos perder este recurso”, disse Leão. “Se perdermos este recurso, sabe quando você vai ter essa obra? Não sei se para o ano, não sei se no próximo ano”, argumentou. Devido à crise, a receita do Estado da Bahia “caiu R$ 100 milhões no mês passado”, disse. “Se continuar nesse ritmo, chegando no final do ano nós vamos ter R$ 1,2 bilhão a menos”. E apelou: “a oportunidade que nós temos está aí”.
SES LAURO DE FREITAS
Representantes da Conder anteriormente haviam alegado que o projeto de drenagem da Lagoa da Base foi concebido quando estava em perspectiva a construção da rede de esgotamento sanitário de Lauro de Freitas. Quando a drenagem fosse concluída, a rede de esgoto já teria sido
instalada. A obra ficou parada porque os recursos disponibilizados para o projeto de 2009 não cobriam mais os custos.
A retomada da execução estava prevista para outubro de 2014. De acordo com Rogério Cedraz, presidente da Embasa, nova licitação para a obra deverá ser feita, “ultimando a aprovação da Caixa, [dentro de] três ou quatro meses”. Entretanto, vem sendo instalado na Paralela o trecho
do interceptor que levará os efluentes até o emissário submarino de Jaguaribe, em Salvador. A execução imediata dessa parte da obra tornou-se necessária para permitir a construção da linha 2 do metrô.
As obras do Sistema de Esgotamento Sanitário (SES) de Lauro de Freitas foram anunciadas há sete anos e iniciadas em 2010. Interrompidas logo depois, com o rompimento do contrato com o consórcio responsável pela empreitada – que não progredia, de acordo com avaliação da Embasa. O consórcio recorreu do rompimento de contrato, conseguindo liminar favorável e dando início a uma questão judicial resolvida apenas em 2014.
Beneficiada com R$ 170 milhões de um programa de saneamento do governo federal em 2009, Lauro de Freitas deverá ter 95% dos domicílios interligados à rede de esgotamento da Embasa quando as obras estiverem concluídas. Parte da empreitada já foi executada, mas não há informações precisas.
O projeto, coordenado pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano do governo estadual, prevê a construção da rede coletora de esgotamento sanitário do município e sua ligação ao emissário submarino de Jaguaribe, em Salvador, através do duto que está sendo implantado na avenida Paralela. Está prevista a implantação de 287 quilômetros de rede coletora de esgoto, 25 estações elevatórias (bombas), 33 quilômetros de linha de recalque (ligação da rede ao interceptor da Paralela) e 40 mil ligações domiciliares.
Cleici Portal mostra o TAC que assinou como anuente
por Ipitanga: feliz com o resultado