Quilômetros de promessas: Semana do Ciclista é celebrada sem ciclovias em Lauro de Freitas

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Esporte, lazer, meio de transporte e até fonte de renda. As bicicletas caíram no gosto das pessoas por todo o mundo, elevando-os à condição de ciclistas e se transformando em um verdadeiro movimento que une consciência ambiental e corporal, mas também gera um leque de oportunidades transversais.

No Brasil, o mês de agosto é um marco na vida dos adeptos do esporte, que desde 2017 celebram o Dia Nacional do Ciclista, uma conquista que ao mesmo tempo homenageia Pedro Davison, jovem de 25 anos que foi atropelado por um motorista alcoolizado no Eixão Sul, em Brasília, e levanta o debate sobre mais segurança e investimentos para o setor.

Em Lauro de Freitas a data tem um gostinho ainda mais especial. Em 2020 o poder municipal aprovou duas leis: uma instituindo a Semana Municipal do Ciclista, celebrado este ano, de 15 a 21 de agosto, e outra que define o uso de 5% das multas de trânsito para a sinalização voltada aos ciclistas no município.

“Foi a primeira vez que o município de Lauro de Freitas teve uma semana do ciclista reconhecida oficialmente, oportunidade que aproveitamos para ressaltar a necessidade de maior atenção aos ciclistas, sobretudo quanto à segurança, e também ao cumprimento da lei com a destinação de 5% da receita arrecadada com as multas de trânsito exclusivamente para a implantação e sinalização de trânsito voltada aos ciclistas”, ressalta o jornalista Hendrik Aquino, especialista em planejamento urbano e gestão de cidades, além de apaixonado pelas bicicletas.

Mas Hendrik destaca que a cobrança quanto a aplicação da Lei nº 1892/2020, que regulamenta a aplicação dos 5%, está obscura, pelo fato da gestão municipal não apresentar, de forma clara e de fácil acesso para os cidadãos, o montante arrecadado com as multas de trânsito no município. No Portal da Transparência da prefeitura de Lauro de Freitas não encontramos nenhuma informação.

“Por enquanto a cidade segue com cerca de 1 km de ciclovia, localizado próximo à praça das Corujas, no loteamento Miragem, utilizada essencialmente para o pedal de lazer, e muitos quilômetros de promessas”.

A maior delas é a ‘Cidade Bicicleta’. Projetada em 2012 pela Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder), a obra fazia parte do legado da Copa do Mundo no Brasil, em 2014, e previa a construção de 217 km de sistema cicloviário em Salvador e Lauro de Freitas, mas sequer saiu do papel.

Em outubro de 2017, o assunto foi destaque na edição da revista Vilas Magazine, que noticiava a promessa de implantação de pelo menos 20 km de ciclofaixas e ciclovias como parte da primeira etapa do projeto, porém com recursos próprios da prefeitura municipal, que à época tinha como gestora Moema Gramacho (PT), que coincidentemente ocupa o cargo atualmente.

Enquanto isso, a vizinha Salvador em 2021 passará a contar com cerca de 310 km de rede cicloviária (ciclovia, ciclofaixa e ciclorrotas) com mais 16 km que foram implantados ou estão em fase de conclusão em vias de Patamares, e nas avenidas Paralela, Carybé e Av. ACM.

Falta de infraestrutura: empecilho para o sistema cicloviário?
“Lembro até hoje da minha primeira bicicleta, uma Caloi Berlineta, modelo dobrável, dos anos 80, que eu levava para os acampamentos em família”. De lá para cá, Hendrik não só manteve o hábito de pedalar, como evidenciou a bicicleta em seus estudos de planejamento urbano.

“Me chama atenção a quantidade de pessoas pedalando pelas ruas de Lauro de Freitas, em sua grande maioria usando modelos simples, como forma de locomoção entre a casa e o trabalho, disputando espaço com os carros e outros veículos, numa cidade com infraestrutura deficiente. Mas há também aqueles para os quais a bicicleta é o lazer do final de semana ou uma fonte de renda. Independente do contexto, o que precisa ser avaliado de imediato é a condição das cidades para receber esse volume de bikes que é cada vez maior”, frisou Hendrik.

Como toda cidade que cresceu de forma acelerada, e sem qualquer planejamento, Lauro de Freitas sofre diariamente com a falta de infraestrutura, malha viária precária e um volume crescente de veículos motorizados, resultado da verticalização da cidade. A Av. Santos Dumont (Estrada
do Coco), principal avenida do município, é o único acesso para moradores, quer seja dos bairros mais populosos como Itinga e Vida Nova, quer seja da orla de Vilas do Atlântico e Buraquinho, e nem a construção da Via Metropolitana conseguiu aliviar o fluxo de quem vai de Salvador para a Linha Verde.

Neste cenário, desde a proposta do projeto Cidade Bicicleta, já havia questionamentos quanto à implantação do sistema cicloviário na cidade. Na proposta apresentada pela Conder, na avenida Luiz Tarquínio, importante via paralela à Estrada do Coco, o trecho de ciclovia possível era de apenas 200 metros, no canteiro lateral da via. Já nas avenidas Fortaleza e São Cristóvão, em Itinga, as ciclofaixas ocupariam os dois lados da via, compartilhadas com o trânsito motorizado.

Apenas em Vilas do Atlântico, loteamento projetado e com ruas mais largas, o cenário era favorável. As ciclofaixas seriam implantadas ao longo das avenidas Praia de Copacabana e Praia de Itapoã, deixando um dos lados da via para o estacionamento de veículos.

“São inegáveis os benefícios do sistema cicloviário para as cidades, desde o estímulo de um menor fluxo de veículos, até a economia de tempo no deslocamento. Claro que é um desafio, ante os problemas de infraestrutura, mas cabe ressaltar que não são problemas enfrentados apenas por Lauro de Freitas e várias outras cidades pelo país conseguiram achar caminhos para ultrapassar essa barreira. O trabalho de educação no trânsito precisará ser intensificado e sem dúvida o resultado final é positivo para todos os envolvidos: cidade, motoristas e ciclistas”, finaliza Hendrik. 

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