Elogio da lealdade no Dia do Amigo

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Ética ou lealdade – e às vezes só vergonha na cara mesmo – são conceitos que poderiam substituir-se ao da amizade, um sentimento tão banalizado que só no Brasil é comemorado em três datas diferentes: uma delas é neste 18 de abril. O 20 de julho e o 30 de julho são as outras duas. Mas a maioria das pessoas lembra-se dos “amigos” é em 4 de fevereiro – quando o Facebook avisa que é hora de comemorar a amizade.
 
A data, que corresponde ao dia da fundação daquela rede social, talvez seja a mais representativa do parco valor que o termo adquiriu. Pessoas que acreditam ter milhares de amigos apenas porque elas estão na sua página do Facebook recebem em fevereiro calorosas juras de amizade eterna enviadas por perfeitos desconhecidos.
 
O que muitas vezes chamamos de amigo é na verdade alguém com quem partilhamos um interesse qualquer. Alguém que é, por vezes, incômodo, porque ele também usa o conceito para abusar da relação que finge manter conosco.
 
Amigos, ao contrário do que se pensa mais comumente, não são destino preferencial de pedidos de favores.
 
Antes pelo contrário.
 
Por amizade, favor nenhum se deve pedir a eles. Até porque, se amigos são, o favor farão sem que sejam solicitados. Aos amigos não se pedem sacrifícios. Antes os oferecemos.
 
O jornalista e escritor gaúcho Fabrício Carpinejar, que publicou em 2017, pela Bertrand Brasil, uma coletânea de 122 crônicas sob o título “Amizade também é amor”, aborda esse sentimento também em contraste com a vulgaridade dos nossos dias, quando relações de todos os tipos são tão fluidas e instáveis que tudo parece ter perdido o sentido.
 
A deslealdade, muitas vezes confundida com a defesa de interesses próprios, como se esta a justificasse, também aparece na crítica desenfreada ao outro. A amizade não autoriza a emboscada, o embuste, o abuso que a intimidade parece permitir. Aqui também, antes pelo contrário. O respeito que dedicamos aos estranhos é ainda mais devido aos que chamamos de amigos.
 
“Estranho equilíbrio”, uma das crônicas de Carpinejar, começa por citar um provérbio: “se quer ser amigo feche um olho, se quer manter uma amizade feche os dois olhos”. Porque “amizade é fugir do julgamento, é compreender a alternância, os altos e baixos, os desabafos”. Porque “amigo não cobra coerência, não fica em cima cutucando feridas”.
 
Antes de Carpinejar, a mitologia grega nos legou uma visão mais consistente da amizade, ao retratar a relação entre Orestes e Pílades – talvez os amigos mais famosos da literatura clássica. É Orestes quem afirma: “todo homem que, pelo seu caráter, é unido a outro, ainda que seja um estranho, vale mais tê-lo como amigo do que ser parentes sem conta”.
 
Não por acaso, destinado por Apolo a matar a própria mãe para vingar o assassinato de seu pai, Orestes hesita no momento final, mas desfere o golpe ao ser instigado por Pílades, seu grande amigo de toda a vida. O remorso enlouquece Orestes, mas Pílades ainda está a seu lado e juntos até o fim da vida cumprem outras missões ordenadas por Apolo.
 
OS HOMENS BONS
A amizade também ocupou o filósofo grego Aristóteles, que em Ética a Nicômaco lhe dedicou um capítulo – estabelecendo para sempre o elo que ainda hoje existe entre os dois conceitos.
 
“A amizade perfeita é a dos homens que são bons e afins na virtude, pois esses desejam igualmente bem um ao outro enquanto bons, e são bons em si mesmos”, escreveu – “Ora, os que desejam bem aos seus amigos por eles mesmos são os mais verdadeiramente amigos, porque o fazem em razão da sua própria natureza e não acidentalmente”.
 
O filósofo lista ainda as amizades imperfeitas, “quando o que se leva em mira é o prazer ou a utilidade”, caso em que “até os maus podem ser amigos uns dos outros, ou os bons podem ser amigos dos maus”.
 
BOA PRAÇA José Valdir (de blusa azul) é uma dessas pessoas que vale muito à pena conhecer. Sempre com uma piada pronta, onde está presente, presente está o bom humor. Pessoas que lhe dedicam amizade, como Jorge Márcio, Tadeu Tramontina e Gilberto Bezerro – há mais de 15 anos – não abrem mão da sua companhia, em qualquer dia, a qualquer hora, até para saudar um novo dia.

 

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