Quem nunca recebeu, de uma tia ou avó que moram no interior, uma receita de chá que é “bom para isso ou aquilo”? Isso sem falar nas pequenas hortas caseiras que sempre tem ervas como manjericão, hortelã e boldo, prontos para oferecer a quem precisar.
A pandemia do novo coronavírus fez crescer a busca por um estilo de vida mais saudável e junto com ela o uso de fitoterápicos, como florais, óleos essenciais e chás, para tratar, sobretudo, os transtornos relacionados a mente, como estresse, insônia e ansiedade.
Pesquisa realizada pelo Google e divulgada pelo jornal O Estado de São Paulo, destaca um crescimento de 98% na busca por termos relacionados a transtornos mentais em 2020, se comparado com a média dos últimos 10 anos. Perguntas como ‘o que é a felicidade’ e ‘como lidar com a ansiedade’, bateram o recorde de busca.
“Muitas pessoas, que nem imaginavam passar por essas questões de saúde, perceberam significativas mudanças de comportamento e começaram a buscar uma abordagem de tratamento mais integrativa, onde o ser humano é visto por completo. Entre diversas abordagens possíveis, os fitoterápicos são de grande valia por serem mais baratos e de fácil acesso, sejam em forma de chás, cápsulas, florais e óleos essenciais’, destaca Clarissa Azevêdo, fisioterapeuta especializada em fitoterapia chinesa.
A profissional destaca que muitas desordens de saúde podem ser tratadas com os fitoterápicos, lembrando que estamos falando das primeiras substâncias usadas pelo homem, desde os primórdios da sociedade, na busca por uma vida saudável. “Existem estudos sérios em todo o mundo comprovando a eficácia das ervas no controle e cura de diversas patologias, como é o caso, por exemplo, da cúrcuma,que tem sido apontada como uma grande esperança contra doenças crônicas e inflamatórias como cardiopatias, diabetes e Alzheimer. Obviamente que existem limites para qualquer tipo de terapia, mas são enormes os benefícios de uma abordagem fitoterápica quando bem indicada, seja para prevenir, tratar ou apenas controlar problemas de saúde”, concluiu.
Hora do chá
O hábito de beber chá é antigo e em cada país tem um sentido. Os ingleses, por exemplo, começaram a consumir chás ainda no século 17, quando a princesa portuguesa Catarina de Bragança, casada com o rei dom Carlos 2º, introduziu o chá ao pequeno almoço. Anos mais tarde, para diminuir a fome entre as refeições, a duquesa de Bedford lançou a moda de fazer uma pequena refeição no final da tarde, com bolos e sanduíches acompanhada de uma chávena de chá, o que logo virou uma tendência em toda corte e alta sociedade inglesa. Nascia assim o Chá das Cinco.
No Brasil, chás e infusões receberam a influência da cultura europeia, chinesa, africana e indígena, sendo consumido, tanto em substituição ao cafezinho, como para o objetivo de cura. Segundo pesquisa da consultoria Europass Monitor, o consumo per capita de chás no Brasil cresceu 53% entre 2010 e 2019.
Os benefícios são os mais variados. Na lista dos mais pedidos no mundo estão o chá preto e chá verde, geralmente associados ao emagrecimento. Nos restaurantes, comumente vemos chá de hortelã ou abacaxi, para auxiliar a digestão. Ervas com menor grau de toxicidade, como melissa, camomila, capim-santo e erva cidreira, que muitas pessoas plantam em casa, podem ser consumidos, com moderação e de forma alternada, ao anoitecer, para garantir um sono reparador.
“O hábito de tomar chá pode ser interessante para ajudar no equilíbrio da saúde. Este é um conhecimento muito valioso que os mais idosos sabem como utilizar e geralmente não recomendam que se use chás todos os dias, por exemplo, ou sem que haja uma necessidade específica. Como orientações, eu diria: não beba sempre o mesmo chá, existe uma variedade de sabores; se o sintoma persistir, procure a causa para tratar corretamente; se fizer algum tratamento para doença, busque orientação ou pesquise sobre efeitos adversos; cuidado em dobro com gestantes, crianças e idosos. E, acima de tudo, lembre-se que cada corpo tem suas particularidades. O mesmo tratamento que fez bem para um parente pode não ser o indicado para você”, frisa Letícia Falleiro, fisioterapeita especializada em aromaterapia.
Não é por ser um tratamento ‘natural’ que é inofensivo
Letícia observa que desde o início da pandemia os fitoterápicos ganharam mais destaque, sobretudo os chás, pela praticidade, já que é possível comprar as ervas em feiras ou lojas especializadas e fazer o chá em casa. Segundo ela, dificilmente alguém terá um efeito adverso por utilizar um chá, mas é importante ter cuidado com o uso indiscriminado.
“O que acontece é que este conhecimento está sendo banalizado, como se as plantas não tivessem características específicas e por isso as pessoas usam de forma indiscriminada. O risco de um efeito adverso no consumo do chá é menor que na utilização de óleos essenciais, por exemplo, pois no chá a concentração dos princípios ativos é bem menor. Mas os riscos existem e é importante sempre reforçar que ao utilizar um chá, por exemplo para azia, e os sintomas persistirem, se procure um profissional para que ele auxilie a encontrar a causa daquele sintoma e tratá-lo corretamente. Quanto mais cedo identificamos as causas do sintoma, mais eficaz será o tratamento”, aconselha Letícia.
Clarissa Azevêdo complementa que mesmo as que ervas pareçam inocentes podem levar a uma intoxicação no caso de uso prolongado. “Algumas ervas podem sobrecarregar o fígado, outras podem prejudicar o funcionamento dos rins, existe também a questão da interação medicamentosa, ou seja, se o indivíduo faz uso de alguma substância, pode haver uma alteração na absorção desta, isso pode acontecer com apenas uma xícara de chá. Vai desde uma anulação do efeito de um anticoncepcional até a potencialização de um medicamento e assim trazer muitos riscos à saúde”.
Em relação aos óleos essenciais, podemos usar no difusor de ambiente, no difusor pessoal (colar) ou passar na sola dos pés, sempre de forma diluída e em pouca quantidade. Quanto aos florais, para uma indicação de uso com precisão o ideal é fazer uma avaliação individual.
Sintomas da pandemia
Letícia Falleiro percebeu que nos últimos meses aumentou o número de pessoas que entram em contato perguntando sobre a utilização dos óleos essenciais, por exemplo, e a eficácia dos resultados no combate de sintomas de ansiedade e estresse. A profissional destaca que apesar dos benefícios das ervas já serem conhecidos, é sempre importante lembrar que a mesma patologia pode aparecer com sintomas diferentes em cada pessoa.
“Cada pessoa deve observar e buscar entender o que está acontecendo, mas de uma forma geral podemos incluir em nossas rotinas alguns hábitos que gerem mais qualidade de vida, como por exemplo, tomar uma xícara de chá de erva cidreira ou camomila para relaxar após um dia intenso de trabalho ou de estudos, ou mesmo antes de dormir, para melhorar a qualidade do sono, assim como podemos tomar um chá de hortelã após as refeições para auxiliar na digestão. Entretanto, se houver algum desconforto ou sintoma persistente, é preciso procurar ajuda profissional”.
Quanto aos óleos essenciais, ela reforça que por serem compostos muito concentrados, o cuidado deve ser ainda maior: os óleos essenciais devem ser usados diluídos em óleo vegetal, nunca direto sobre a pele e nem ingeridos sem a orientação de um aromaterapeuta.
“De forma geral, precisamos manter nosso corpo saudável para lidar com as diferentes situações da vida. Por isso, o mais importante é ter hábitos de vida que conservem o equilíbrio do nosso corpo: meditação, atividade física regular e prazerosa, sono reparador, alimentação adequada e relações solidárias e amorosas, tanto interpessoais quanto consigo mesmo. E, se algum destes aspectos estiver em desequilíbrio, não hesite em buscar um profissional que possa lhe orientar a encontrar seu equilíbrio interno novamente”, conclui a profissional.