O consenso entre profissionais de saúde é que nos últimos meses de vida de um paciente, esgotadas as alternativas de tratamento, o melhor é garantir que ele receba cuidados paliativos para amenizar a dor e melhorar a qualidade de vida.
O problema é quando o tratamento médico convencional – que incluem os cuidado paliativos – acabam sendo substituídos por supostas alternativas, modalidades sem qualquer comprovação mensurável de benefícios quando o assunto é a cura da doença ou sobrevida.
Foi mais ou menos essa discussão que surgiu após a morte do jornalista e apresentador de TV, Marcelo Rezende, em setembro, em decorrência de um câncer de pâncreas em estágio avançado. Ele estava com 65 anos.
Nos últimos meses, Marcelo Rezende publicou periodicamente em suas redes sociais vídeos em que dizia estar buscando a cura por meio da fé. O fato de ele ter abandonado o tratamento convencional acabou fomentando a discussão sobre sua saúde.
“É uma questão ética. Qualquer paciente tem o direito de aceitar ou recusar qualquer tipo de tratamento. É um princípio básico”, diz a médica paliativista Maria Goretti Maciel, diretora do Instituto Paliar, em São Paulo.
Mesmo assim, diz a especialista, o papel do médico é tentar esclarecer o panorama do tratamento e fazer um exercício de empatia, de modo a entrar no universo do paciente e tentar, sob o ponto de vista dele, ajudar a fazer as melhores escolhas.
“O que não pode acontecer é culpar um homem pela própria morte, como se ele tivesse morrido porque não quis se tratar. Ele morreu em decorrência de uma doença grave, a chance de um tratamento curativo era muito pequena. Talvez o tratamento postergasse a morte, talvez ele tenha escolhido viver bem ou talvez ele tivesse um grande medo. A gente não pode julgar”, diz Goretti Maciel.
(FOTO: Morte de Marcelo Rezende suscitou debate sobre tratamentos alternativos para o câncer)
Para o geriatra André Filipe dos Santos, da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, é fundamental deixar claro para o paciente por quais procedimentos ele passará e para quê. “Existe a modalidade de quimioterapia paliativa, para melhorar os sintomas do câncer e a qualidade de vida, e não para curar. Curiosamente, 70% dos pacientes que recebem esse tratamento acham que estão curados.
FILOSOFIA
Segundo o filósofo e professor Rafael Nogueira, é comum haver uma espécie de despreparo, ou “falta de treino filosófico” quando o assunto é a morte.
“Muitas vezes a mensagem é dura e a pessoa não aceita, já que aquilo que a medicina promete é muito pouco. Aí ela sai em busca de tratamentos que sejam mais afins à sua teimosia”, diz.
Segundo Nogueira, há ao menos outras duas maneiras mais maduras de lidar com o tema. Uma é esgotar os recursos oferecidos pela medicina e pela ciência “e só aí partir para a pseudomedicina/tratamentos alternativos”, como chás e cirurgias espirituais.
E o jeito mais “cristão e comum” é seguir o tratamento convencional e, ao mesmo tempo rezar e pedir orações para os amigos familiares, por exempo. “Se a medicina não funcionar, Deus é chamado para prestar um auxílio”.