Colapso na saúde

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“É só um almoço, vão poucas pessoas… É só uma festinha, já fiquei muito tempo em casa, preciso limpar minha mente para não enlouquecer… Como assim não vai ter carnaval? Vem todo muito aqui em casa que fazemos o bloco… É só mais uma vida!”

Ano passado, nesta mesma época do ano, estávamos vivendo a ressaca do carnaval, tanto os foliões e as pessoas que aproveitaram para ganhar uma renda extra, como aquelas que fugiram de Salvador em busca de dias de paz e silêncio. A Covid-19 já mostrava sua força pelo mundo, com casos pela Ásia e Europa, mas de alguma forma seguimos nossas vidas como se toda a alegria dos dias de carnaval fosse agir como escudo contra os males do mundo.

Mas não foi bem assim e não tardou muito para que o primeiro caso da Covid-19 fosse registrado na Bahia. Desde então entramos em modo de alerta: incorporamos a máscara como item indispensável na nossa rotina diária; reaprendemos a nos relacionar com o outro, sem apertos de mãos e abraços; descobrimos quão importante é uma medida básica de higiene, como a de lavar as mãos; pulamos feriados e festas tradicionais do nosso calendário; vimos o comércio fechar e abrir logo em seguida; vimos pessoas se desesperando e fazendo até estoque de comida; vimos os preços de tudo, sobretudo alimentos e combustíveis, vertiginosamente; vimos a tão ansiada vacina chegar; vimos como a burocracia pode agir contra a luta pela vida; vimos que, em tudo, exatamente tudo, a política tem um peso muito grande; presenciamos, incrédulos, atos de corrupção em total desrespeito a vida de pacientes; vimos a vacina acabar e agora esperamos pacientemente para o dia que receberemos essa dose de esperança. E o que aprendemos ao longo deste ano? Parece que nada.

Fechamos o mês de fevereiro com números assustadores. No Brasil, o número de mortes por Covid-19 já supera a marca de 255 mil, lembrando que esses são apenas os dados oficiais e confirmados em 28 de fevereiro, não sendo consideradas as mortes sem diagnósticos, pessoas que sequer foram a um hospital e casos indiretos, como mortes por falta de leitos, independente da doença.

11 estados, dos 27 que formam o Brasil, já sinalizam o inchaço dos hospitais, muitos com 100% dos leitos em UTIs para Covid-19 ocupados e uma fila interminável de pacientes aguardando regulação. E a Bahia, infelizmente, está nesta lista.

Em julho do ano passado, período que pensávamos ser o pico da contaminação, a Bahia atingiu a marca de 14.520 casos ativos (25/7/2020). No dia 28 de fevereiro, o número chegou a 20.506 ativos. No mesmo dia, a taxa de ocupação dos leitos de UTIs adulto atingiu a marca de 84% e as UTIs pediátricas, 72%. O número de mortes no estado já ultrapassava a marca de 11 mil, número maior que a população de aproximadamente 23% dos municípios da Bahia.

Em Lauro de Freitas, também em fevereiro, noticiamos o inchaço no serviço de saúde, com 100% de ocupação no PA Santo Amaro de Ipitanga, realidade vivida também em hospitais de Salvador.

Se no início do mês o debate era sobre reabrir ou não as escolas no modelo híbrido, com dias de aula online e outros de aulas presenciais, com direito a ação na justiça para obrigar uma decisão por parte do governo do estado, no final de fevereito a preocupação era se conseguiríamos manter o comércio aberto por mais alguns dias ou voltar a adotar medidas mais severas, como um lockdown.

E se for necessário, o governador Rui Costa já deu o recado: não vai hesitar. A primeira medida adotada foi o toque de recolher, que entre 19 e 28 de fevereiro, restringiu a circulação noturna das pessoas, das 20h às 5h, com modificação no horário dos transportes públicos e fiscalização intensa. Mas com os números ainda em crescimento, entre as 17h de 26 de fevereiro até às 5h de 1º de março, todo o comércio foi fechado, em Salvador e outras cidades litorâneas barreiras foram colocadas nas praias, as cirurgias eletivas foram canceladas, a venda de bebida alcoólica foi proibida, numa tentativa de frear os casos de Covid-19 e aliviar os leitos dos hospitais. Na noite de domingo, 28 de fevereiro, as duas medidas foram prorrogadas.

Cabe frisar sempre, que, apesar do caos provocado pela Covid-19 e até a suspensão de cirurgias eletivas, as outras doenças continuam acontecendo e cabe indagar: é justo que um profi ssional de saúde, pessoa que estudou e foi treinada para salvar vidas, tenha que decidir quem merece prioritariamente usar um leito, se uma pessoa que se contaminou com a Covid-19 ou a que sofreu um acidente grave e precisa urgente de cirurgia?

Talvez o pior seja saber que grande parte da contaminação da Covid-19 é o resultado do arroubo juvenil, que toda semana dá um trabalho danado para a Polícia Militar, Polícia Civil e órgãos de fiscalização, que são chamados para encerrar festas com 100, 200, às vezes mais pessoas, quer seja em bairros populares, quer seja em casas de condomínios de luxo. Enquanto isso, apesar da taxa de letalidade ser maior nos idosos, mais de 60% dos casos confirmados na Bahia são de pessoas entre 20 e 49 anos.

E mesmo com tudo que vivemos nos últi mos meses, quem deveria dar o exemplo, segue nas ruas, aglomerando, sem usar máscaras, insisti ndo no uso de medicamentos comprovadamente sem efeito e fazendo esforços tímidos, carregados de burocracias, para aquisição de vacinas num ritmo mais lento que um conta gotas.

 

Na capa, campanha de conscientização da prefeitura de Canoas – RS

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