
O reinício das obras de reversão da drenagem da Lagoa da Base, o que trouxe as máquinas de volta a Vilas do Atlântico em dezembro, foi motivo para o primeiro ato de protesto do “Coletivo do Bem” no bairro. Em stand-up paddles no leito do rio Sapato, em Ipitanga, participantes do movimento abriram faixas de protesto pedindo a recuperação do curso d’água e posaram para fotos no próprio canteiro de obras, em Ipitanga.
Quando a obra de reversão da drenagem estiver concluída, é para o Sapato que correrá o fluxo pluvial da Lagoa da Base e da rua da Irmandade. A obra, de responsabilidade da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (Conder) visa eliminar o recorrente alagamento das residências daquela região em época de chuvas, mas entidades de moradores de Vilas do Atlântico receiam que junto com a drenagem pluvial vá parar ao rio Sapato também o esgoto doméstico da Lagoa da Base – fora o lixo urbano normalmente carreado para os cursos d’água quando chove.
Além das entidades representativas de moradores e de surfistas, a “Remada Protesto pela Revitalização do Rio Sapato” reuniu pessoas sem qualquer afiliação associativa, interessadas na preservação do rio e das praias de Lauro de Freitas. O “Coletivo do Bem” promete outras ações de protesto.

Estandarte na margem do Sapato em Vilas do Atlântico: luto pelas condições do rio e da praia
Uma dessas ações tomou as margens do rio Sapato e o calçadão de Vilas do Atlântico no dia 23 de dezembro, antevéspera do Natal, para chamar atenção para os problemas do bairro. Uma cruz negra com flâmula “de luto” denunciava os problemas: “ambulantes desordenando e desconfigurando a orla, acúmulo de lixo na orla, ônibus de excursões, estacionamento em pista dupla na avenida Praia de Copacabana, esgotos lançados no rio Sapato, morte do rio Sapato, violência e assaltos na região”.
Na Internet, uma proposta de abaixoassinado dirigido à Justiça recolhe adesões no site “Petição Pública” (https://goo.gl/zst01q) e registrava quase 300 assinaturas na data do fechamento desta edição da Vilas Magazine. O manifesto online é “contra o despejo maciço de esgoto” no rio Sapato, que os autores afirmam ser a consequência imediata da obra.
Para Janaína Ribeiro, presidente da Associação de Moradores de Vilas do Atlântico (Amova) e membro do coletivo, a ideia é promover “um conjunto ações específicas com o objetivo de lutar pelo saneamento básico de toda Lauro de Freitas e pela revitalização do rio Sapato e do meio ambiente”.
A Amova posiciona-se “contra a obra da Conder para a Lagoa da Base da forma como foi concebida” por acreditar que o saneamento básico deve vir antes, “beneficiando a todos e não transferindo esgoto de uma localidade para a outra, estimulando a luta de classes e a desmobilização social”.

Obra da Conder volta ao rio Sapato em Vilas do Atlântico
Os moradores da Lagoa da Base e rua da Irmandade – comunidades menos favorecidas da cidade – veem na obra uma oportunidade para eliminar os alagamentos, problema que se arrasta há décadas – embora também reivindiquem o esgotamento sanitário.
As entidades de Vilas do Atlântico sustentam que a drenagem deve ser feita para o rio Ipitanga, respeitando a bacia hidrográfica natural para a Lagoa da Base – e não ser revertida para o rio Sapato. A Amova questiona também, na Justiça, o licenciamento ambiental da obra, que ainda poderá ser embargada.
A reversão da drenagem foi interditada pela prefeitura de Lauro de Freitas em outubro de 2015, seguindo recomendação do Ministério Público, mas liberada pelo município em fevereiro de 2016, depois que a Embasa se comprometeu a construir um sistema de “tomada de tempo seco” como solução paliativa. Eventuais dejetos domésticos seriam lançados no rio Sapato, mas apenas em tempo de chuva. Como solução definitiva, seria construído depois um sistema de esgotamento sanitário para a Lagoa da Base.
Tomada de Tempo Seco
Em fevereiro de 2016, durante reunião com o vice-governador João Leão e associações de moradores, o prefeito Márcio Paiva (PP) defendeu a Conder, que “não omitiu nenhuma informação, disse que é uma obra de drenagem, mas que vão sim, dejetos contaminados” e lembrou que o alvará inicial para a obra exigia a solução de esgotamento sanitário da Lagoa da Base – embora a rede de esgoto não estivesse prevista no projeto.
Janaína Ribeiro, presidente da Amova, considerou “mambembe” a proposta para o esgotamento sanitário provisório da Lagoa da Base– e que não abrange a área da rua da Irmandade, também a drenar para o Sapato.
O sistema convencional de esgotamento sanitário prevê duas redes independentes – uma para o esgoto e outra para a água pluvial. A solução de “tempo seco” consiste na interceptação do esgoto na própria rede pluvial quando não chove em excesso, bombeando-se os dejetos para emissários ou estações de tratamento.
Na ocorrência de chuvas mais intensas, a ideia é que o grande volume de água dilua o esgoto que vai chegar aos rios e à praia – mas que efetivamente lá chegará. O problema desse sistema está no meio termo: pode chover o suficiente para fazer transbordar o coletor de tempo seco, mas em volume insuficiente para diluir os dejetos de esgotamento doméstico, o que vai agravar a poluição do Sapato.
No caso da Lagoa da Base, a proposta é construir uma estação elevatória e conduzir os dejetos captados em tempo seco para a tubulação da Embasa em Salvador, via Ipitanga. A prefeitura de Lauro de Freitas aceitou operar e manter “com recursos próprios” a estação elevatória e o sistema de tomada de tempo seco, apesar de o esgotamento sanitário ser uma responsabilidade do governo estadual.
Mas tudo isso seria provisório.
A Embasa se comprometeu a elaborar projeto definitivo de rede de esgotamento da comunidade da Lagoa da Base.

SES
As obras do Sistema de Esgotamento Sanitário (SES) de Lauro de Freitas foram iniciadas em 2010 e interrompidas logo depois, com o rompimento do contrato com o consórcio responsável pela empreitada – que não progredia, de acordo com avaliação da Embasa. O consórcio recorreu do rompimento, conseguindo liminar favorável e dando início a uma questão judicial resolvida apenas em 2015. A última informação disponibilizada pela Embasa dá conta do reinício das obras em algumas partes da cidade, que seriam imediatamente interligadas ao emissário submarino de Jaguaribe, em Salvador.
Beneficiada com R$ 170 milhões de um programa de saneamento do governo federal em 2009, Lauro de Freitas deveria ter 95% dos domicílios interligados à rede de esgotamento da Embasa quando as obras estivessem concluídas.
O projeto prevê a construção da rede coletora de esgotamento sanitário do município e sua ligação ao emissário submarino, através de um duto que já foi implantado na avenida Paralela – por força da obra da linha 2 do metrô, que passa por cima do duto. Estava prevista a implantação de 287 quilômetros de rede coletora de esgoto, 25 estações elevatórias (bombas), 33 quilômetros de linha de recalque (ligação da rede ao interceptor da Paralela) e 40 mil ligações domiciliares.