Tiradentes revela o que está por trás das delícias mineiras

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Moradores abrem sítios para visitação e oferecem boa comida e prosa
 
Um armazém singelo, com uma balança antiga no balcão, prateleiras abastecidas por latas de biscoito revestidas com tecido de chita e um orelhão na entrada. No igualmente acanhado sítio ali em frente, a fumaça que sai de uma chaminé estreita é sinal de que a cachaça está a todo o vapor no alambique – instalado em uma construção sem paredes.
 
Vista das ladeiras de Tiradentes e da serra de São José
 
A zona rural de Tiradentes, na estrada da Caixa d’Água, é de uma simplicidade extrema – e é ela que esconde parte do seu charme. Pois é de lá que saem algumas das delícias que abastecem as mesas de restaurantes e pousadas da cidade colonial mineira.
 
E é a explorar a simplicidade dos produtores locais que partem do centro pequenos grupos de turistas, em um projeto batizado Sabores da Estrada da Caixa d’Água. O circuito é uma parceria com a agência Libertas, de Belo Horizonte (tel. 31/2516-0333; preço sob consulta) – pode ser feito por conta própria também. Lançado em junho do ano passado, foi uma das atrações do Festival de Cultura e Gastronomia de Tiradentes, realizado no final de agosto de 2015.
 
Ao todo, 11 produtores rurais foram mobilizados para receber visitantes e mostrar, do jeitinho mais hospitaleiramente mineiro, a artesanalidade de seus saberes.
 
Por ali, o turista vê que a cachaça, o queijo – mozarela ou frescal –, os biscoitos, a linguiça e os docinhos têm por trás uma prática particular, um rosto, um sorriso: do Juca do Lino, do Chiquinho, da Rosileia, da Rosana…
 
Empório da Roça
O passeio começa na venda de Vera Lucia da Silveira, a Lucinha, que, com o projeto, acabou por rebatizar seu armazém como um legítimo ‘empório da roça’.
 
Mesas na varanda do restaurante Sabor Rural, e abaixo, Rosquinhas feitas por Rosana Nascimento, em Caixa D´Água
 
Ali são encontrados ingredientes produzidos pelos moradores do distrito – chamado de Caixa d’Água justamente porque na região resistem as ruínas de um reservatório que abastecia a locomotiva da linha que cortava a região, ligando-a a Tiradentes.
 
Estão nas prateleiras, por exemplo, os biscoitos de Rosana Nascimento: há rosquinhas, goiabinhas, broinhas de fubá, biscoitos de nata, quebra-quebra… Mas mais gostoso talvez seja ir até o sítio de Rosana, o Bela Vista, para sentar-se na varanda e ouvir a prosa mineira ao provar os quitutes com café recémpassado, atividade devidamente mineira.
 
Uma quitandinha (em ‘mineirês’, quitanda é um tabuleiro de quitutes) com bom papo é também uma das atrações do sítio do Engenho, em que Rosileia Aparecida Silveira produz mozarela – cerca de 20 quilos por dia.
 
O queijo, que tem valores a depender do formato (pode ser em barra, bolinhas ou nozinhos), é feito com leite de um pequeno rebanho, criado ali mesmo na propriedade.
 
Biscoitos, queijos e cachaça feitos em distrito abastecem bares e restaurantes do centro da cidade histórica
 
Outra parada do roteiro é no alambique de seu Juca do Lino, que, aos 78 anos, ainda comanda a produção de 350 litros de cachaça por semana.
 
A receita, que ele segue há mais de 20 anos, tem a cana fermentada em canjiquinha antes de passar pelo alambique rústico, com traços de improviso.
 
A bebida, branquinha e de sabor intenso, pode ser encontrada também em alguns pontos de Tiradentes, como o Bar do João Rosa, no largo das Forras.
 
Antes de voltar ao centro, a sacola ainda pode receber as linguiças artesanais de Adineia, os crochês e artesanatos de Geralda, o mel de Chiquinho, os peixes do Zé…
 
Roteiro de sete horas inclui frango, tutu e leitoa assada
Em passeio por distrito de Tiradentes, turista pode parar em dois restaurantes típicos
No distrito de Caixa d’Água, na zona rural de Tiradentes, uma figura recorrente é a do barão de Santa Maria: diz-se que as ruínas do reservatório e a linha do trem, por exemplo, são ‘do tempo do barão’.
 
Celia Silveira exibe a leitoa que serve na varanda do sítio. 
 
Na verdade, pouco se sabe concretamente sobre a história dele – além do fato de que teria possuído terras em Piraí (RJ) e morrido em Tiradentes em fins do século 19. E o certo ar de mistério ajuda a ambientar um dos pontos altos do roteiro pela estrada que corta a região.
 
No sítio do Barão, a varanda de Celia Silveira, 52, tem vista para escombros do chalé (que tem mais jeito de mansão) do militar, derrubado há cerca de 40 anos. As toalhas de chita a cobrir as mesas de madeira fizeram do lugar um restaurante, em que Celinha serve uma receita de leitoa pururuca ensinada por sua bisavó. Prato do tempo e da família do barão.
 
O animal é criado, abatido e preparado ali. Ele descansa por sete dias em uma marinada de vinho, alho e sal, com temperos plantados no mesmo sítio – manjericão, tomilho, alecrim. Depois, é assado na brasa de carvão, por ao menos sete horas, até ganhar um gostinho defumado. Chega à mesa com arroz e tutu.
 
A estrada da Caixa d’Água passa também pelo Sabor Rural, especializado na cozinha típica mineira. Com grandes mesas na varanda, fica em um espaço agradável e campestre, cercado de árvores. A refeição pode ser aberta com a caipirinha, servida numa chaleira. Pratos com o tutu com porco e linguiça, feijão tropeiro e frango com ora-pro-nóbis, servem de duas a quatro pessoas.
 
Distrito de Bichinho concentra os artesãos locais
Outro distrito afastado cerca de 15 minutos de Tiradentes (na verdade já parte do município vizinho de Prados), Bichinho também atrai muitos turistas da cidade.
 
No local estão instalados vários dos artesãos locais – que, por vezes, revendem suas peças também em lojas no centro de Tiradentes. Um dos mais conhecidos é Antônio Carlos Bech, da Oficina de Agosto.
 
Nos ateliês de Bichinho, móveis e peças decorativas, entre o religioso e o sensual, podem não sair tão barato, mas garantem um bom passeio.

Ladeira e casario colonial no centro histórico de Tiradentes

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